É engraçado perguntar para um brasileiro que mora há algum tempo em Paris como é que se fala "bio" em português. "Bio" é como os franceses chamam produtos agrícolas não-transgênicos e plantados sem agrotóxicos - o que a gente chama no Brasil de "orgânicos". Acontece que a gente usa tanto essa palavra em Paris, e tão pouco no Brasil, que é comum a esquecer da tradução na língua materna.É impressionante o espaço que a agenda verde ocupa na vida de uma cidade como Paris. Há carros elétricos nas ruas - e vagas gratuitas para recarregá-los. Nos supermercados, sacos plásticos para carregar as compras são pagos, o que estimula o consumidor a trazer uma sacola reutilizável de casa.Os produtos "bio" estão nas prateleiras de todos os supermercados - que muitas vezes têm sua própria marca de produtos desse tipo. Até vinhos orgânicos estão disponíveis nas cartas dos restaurantes mais moderninhos.Outra palavra de ordem é o "équitable", que é como os franceses chamam o comércio justo, de produtos feitos sem trabalho infantil, em uma cadeia produtiva remunerada a preços justos e a partir de matéria-prima orgânica.A moda está totalmente contaminada pela onda "équitable" e um dos produtos de maior sucesso desse segmento é uma marca de tênis produzida - adivinha? - no Brasil.O algodão orgânico é plantado no Ceará, a borracha vem da Amazônia e a montagem é feita por uma cooperativa na periferia de São Paulo. Moderninhos e coloridos, os tênis Veja estão nos pés de toda a juventude alternativa da cidade.O conceito entrou na moda com tal força que hoje existe uma profusão de lojas-conceito com uma enorme oferta de produtos vindos do comércio justo. A mais badalada delas é a Merci, que fica em pleno baitrro de Marais e arrebata os corações - e os bolsos - da comunidade verde da cidade.Porque aí está um dos nós do consumo orgânico, justo e ecológico: também por aqui esses produtos são mais caros que os convencionais. O que talvez explique a acolhida menos calorosa dessas iniciativas nos mercados dos países em desenvolvimento como o nosso.Anda cada vez mais organizada - tanto aqui quanto aí, pelo que tive notícia - a turma dos que querem colaborar nessa equação complexa que envolve boas intenções, política, interesses e panoramas econômicos distintos.Assim como a filiação de Marina Silva ao PV tem dado o que falar, por aqui também os políticos verdes estão no centro das atenções.Depois das últimas eleições européias, quando o Europe Écologie atingiu 16,2% dos votos, superando mesmo os socialistas na votação em Paris, o Partido Verde francês entendeu o recado de que sua hora chegou.Para o ano que vem, nas eleições para a presidência das regiões francesas, os verdes já decidiram lançar como candidata a jovem Cécile Duflot, de 34 anos, rompendo a tradicional aliança com o Partido Socialista.O apelo da causa é tamanho que mesmo o direitista Sarkozy está trabalhando para tirar do PV francês o monopólio da defesa ecológica. Sua atual bandeira é a implantação de uma "taxa de carbono", que vai onerar o combustível e de energia, visando a redução do consumo.Claro que a turma da oposição ri da tentativa de monsieur-le-president de surfar na onda alheia, e alega que é só uma desculpa para criar um imposto - que já não são poucos por aqui.O lado bom da polêmica é que, seja de quem for a mão que segura a bandeira, a discussão sobre o novo imposto envolve cada vez mais o cidadão comum na defesa do meio-ambiente - coisa que, no nosso país, está demorando para acontecer.
Carolina Nogueira é jornalista e mora há dois anos em Paris, de onde mantém o blog Le Croissant (www.le-croissant.blogspot.com)
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